Abenepi-Rio

Associação Brasileira de Neurologia e Psiquiatria Infantil e Profissões Afins

Crise Convulsiva

Autora: Dra. Aline Chacon Pereira (Membro do Comitê de Neurologia da Abenepi-Rio)

Faça o download do Guia para Pais – Crise Convulsiva em PDF.

O que é uma crise convulsiva?

Uma crise convulsiva ou epiléptica é a ocorrência transitória de sinais ou sintomas clínicos secundários a uma atividade neuronal anormal excessiva ou sincrônica, podendo ocorrer localmente ou difusamente no cérebro. Se ficarem restritos, a crise será chamada focal; se envolverem os dois hemisférios cerebrais, generalizada. Muitos pacientes podem ter uma única crise ao longo da vida sem novos episódios, essas são chamadas crises provocadas. A causa pode ser por infecção no cérebro (meningoencefalite e/ou encefalite), outras infecções (crise febril), drogas, traumas, distúrbios hidroeletrolíticos e/ou metabólicos como hipoglicemia e hiponatremia.

O que é epilepsia?

Epilepsia é a doença crônica da crise convulsiva. A maioria dos novos diagnósticos é feito em crianças e idosos. O paciente tem história de crises convulsivas não provocadas, ou seja, independente de uma infecção no cérebro, febre, uso de medicações e distúrbios metabólicos.

  A definição de epilepsia pela Liga Internacional de Epilepsia (ILAE) requer a ocorrência de pelo menos uma crise epiléptica. do  ponto de vista prático, a epilepsia pode ser definida por uma das seguintes condições:

– Ao menos duas crises não provocadas ocorrendo com intervalo maior que 24 horas;

– Uma crise não provocada e probabilidade de novas crises ocorrerem nos próximos 10 anos, após duas crises não provocadas (pacientes com alteração no exame de imagem, história de asfixia neonatal ou infecções prévias no cérebro);

– Diagnóstico de uma síndrome epiléptica (exemplos como síndrome West, síndrome Lennox Gastaut, epilepsia rolândica, além de outras; cada síndrome terá uma característica do tipo das crises, do padrão do eletroencefalograma e da idade de início).

Quais indivíduos que podem apresentar?

Cerca de 8 a 10% da população pediátrica apresentará um evento convulsivo durante a vida. Corresponde a 1 a 2% dos atendimentos nas emergências, sendo 25% dessas, a primeira crise convulsiva.  A prevalência de epilepsia ao redor do mundo é estimada em 10 a cada 1.000 pessoas, sendo a 4ª doença neurológica mais comum no mundo.

Quais as características das crises convulsivas?

Os sintomas das crises convulsivas podem ser diversos. Podem ser sintomas físicos motores como movimentos clônicos de braços, pernas e do corpo (crises clônicos); movimentos de enrijecimento dos membros (crises tônicas); contrações da cabeça para frente e/ou para trás (crises de quedas de cabeça ou astáticas), movimentos de sustos (espasmos e/ou mioclonias) e movimentos de abalos e enrijecimento do corpo todo (crises tônico clônicas generalizadas), esta última pode evoluir para perda do controle da diurese e evacuação. Existem sintomas mentais como confusão mental, perda da consciência (crises focais disperceptivas), breves desligamentos (crises de ausência), períodos de sonolência ou sonhar acordado e dificuldade ou períodos de perda de memória. E ainda, existem sintomas sensoriais como ouvir sons não usuais, sentir cheiros ou texturas específicos, formigamentos ou choque em partes do corpo e sentir-se fora do corpo ou estranho. Sendo assim, por vezes, é difícil identificar.

Como posso ter certeza que a pessoa e/ou criança está tendo uma crise?

Algumas crises são de difícil identificação como relatamos acima e apenas médicos ou demais profissionais da área da saúde serão capazes de identificar. Porém, as crises tônico-clônicas generalizadas são as de maior gravidade e impacto principalmente se forem de longa duração. Quando as crises duram mais de 5 minutos sem que a pessoa recupere a consciência, são perigosas, podendo prejudicar as funções cerebrais. Na tabela abaixo segue algumas dicas que ajudam nessa diferenciação.

 Crises ConvulsivasCrises Não-Convulsivas
OlhosAbertosFechados
CabeçaFixas/ Versão unilateralMovimentos de lado a lado
MembrosEm fase, na mesma direçãoMovimentos fora do eixo
Corpo (Axial)Em linha reta/ Flexão anteriorOpistótono/ Arqueado
Corpo (Movimento)Sem rotaçãoCom rotação
EvoluçãoContínua, sem interrupçãoFlutuante, com interrupção

O que fazer durante uma  crise convulsiva?

A maioria das crises convulsivas se resolve rápido e você não vai precisar fazer nada, mas algumas medidas são importantes:

  1. FICAR PRÓXIMO A PESSOA. OBSERVAR A DURAÇÃO DA CRISE E AS CARACTERISTICAS DAS CRISES;
  2. MANTER A PESSOA EM SEGURANÇA E AFASTAR OBJETOS RÍGIDOS E PONTIAGUDOS;
  3. COLOCAR A CABEÇA LATERALIZADA, PROTEGENDO-A;
  4. SOLTAR PEÇAS DE ROUPA QUE POSSAM ESTAR APERTADAS;
  5. MANTER-SE PRÓXIMO A PESSOA ATÉ QUE A CRISE INTERROMPA.
  6. APÓS A CRISE: Observar se a pessoa está respirando. Confusão mental, cefaleia, náusea, sonolência e fraqueza são sintomas esperados.
  7. EM CRISES PROLONGADAS (mais de 5 min), MÚLTIPLAS, PRIMEIRO EPISÓDIO OU RECORRENTES LIGAR PARA 190 OU PROCURAR EMERGÊNCIA.

O que não fazer durante a crise convulsiva?

  1. NÃO SEGURAR A PESSOA COM FORÇA;
  2. NÃO COLOCAR NENHUM OBJETO NA BOCA;
  3. NÃO DAR COMPRIMIDOS, ÁGUA E COMIDA, enquanto a pessoa estiver inconsciente;
  4. NÃO PRESTAR ASSISTÊNCIA;
  5. DEIXAR A PESSOA SEM SUPERVISÃO NO PÓS-CRISE.

Eu preciso sempre levar a pessoa com crise convulsiva para a emergência?

Se a crise durar menos de 5 minutos e você souber que a pessoa é epiléptica, não é necessário chamar um médico ou ambulância, como também levar a mesma para a emergência. Você pode entrar em contato com um responsável caso esta esteja sozinha ou levar até a sua casa.

Como confirmar o diagnóstico de epilepsia?

Exames como eletroencefalograma (EEG) e neuroimagem (Tomografia de Crânio e/ou Ressonância de Encéfalo) são ferramentas que auxiliam no diagnóstico. O histórico clínico do paciente, porém, é muito importante, já que exames normais não excluem a possibilidade de a pessoa ser epiléptica. A história familiar também auxilia.  Se o paciente não se lembra das crises, os responsáveis que as presencia torna-se uma testemunha útil na investigação do tipo de epilepsia em questão e, conseqüentemente, na confirmação das crises e seguimento no seu tratamento.

Existem fatores desencadeantes de novas crises convulsivas?

Alguns fatores podem desencadear as crises convulsivas nos pacientes epilépticos como privação do sono, estresse, uso inadequado das medicações anticonvulsivantes, fotoestinulação (videogame e efeitos especiais de filmes), calor excessivo, uso de bebidas alcóolicas e drogas ilícitas.  

Qual o melhor tratamento para a epilepsia?

O principal, entretanto, é procurar auxílio o quanto antes, a fim de receber o tratamento adequado. As drogas antiepilépticas são eficazes na maioria dos casos e os efeitos colaterais têm sido diminuídos. Existe uma grande variedade de medicações que é escolhida de acordo com o tipo de crise, a idade, a síndrome epiléptica e efeitos colaterais. Em caso de crises refratárias (sem controle e em uso de mais de 2 medicações antiepilépticas em dose adequada) deve-se procurar os centros específicos de epilepsia para investigar a possibilidade de métodos não-medicamentosos e cirurgia.

Existe cura para epilepsia?

Em geral, se a pessoa passa mais de 10 anos sem ter crises e 5 anos sem medicação anticonvulsivante, pode ser considerada curada, tendo uma vida normal. Muitas crianças que têm epilepsia apresentam desenvolvimento neuropsicomotor adequado para a idade e, na vida adulta, destacando-se na carreira profissional.

Mitos sobre a Epilepsia

  1. Não é uma DOENÇA CONTAGIOSA;
  2. Nem toda crise convulsiva vai virar epilepsia;
  3. Nem toda crise é como na TV: ao invés de “se debater”, existem tipos de crise nas quais o paciente continua lúcido e consegue inclusive falar.
  4. A língua não enrola. É apenas uma impressão pelo aumento da saliva.
  5. Não é uma “doença mental”. Muitos pacientes que tem epilepsia e fazem uso de medicação adequada apresentam uma vida normal.

Referências Bibliográficas:

1. Bergey GK. Management of a First Seizure. Continuum Review Article American Academy of Neurology, 2016.

2. Hoop JL. Nonepileptic Episodic Events. Continuum Review Article American Academy of Neurology, 2019

3. Berg AT, Berkovic SF, Brodie MJ, et al. Revised terminology and concepts for organization of seizures and epilepsies: report of the ILAE Commission on Classification and Terminology, 2005–2009. Epilepsia 2010;51:676–685;

4. Fisher RS, Cross JH, D’Souza C. et al. Instruction manual for the ILAE 2017 operational classification of seizures types. Epilepsia 2017; 58(4):531-542;

5. Ministério da Saúde. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas da Epilepsia, 2018.